Max Weber viveu numa época em que as idéias de Freud impactavam as ciências sociais e em que os valores do individualismo moderno começavam a se consolidar. A grande inovação que Weber trouxe para a sociologia foi o individualismo metodológico. Para ele, o indivíduo escolhe ser o que é, embora as escolhas sejam limitadas pelo grau de conhecimento do indivíduo e pelas oportunidades oferecidas pela sociedade. O indivíduo é levado a escolher em todo instante, o que faz da vida uma constante possibilidade de mudança. O indivíduo escolhe em meio aos embates da vida social. Essa idéia faz com que o sentido da vida, da história, seja dado pelo próprio indivíduo. Os processos não têm sentido neles mesmos, mas são os indivíduos que dão sentido aos processos.
Ação Social
Para Weber a sociedade não seria algo exterior e superior aos indivíduos, como em Durkheim. Para ele, a sociedade pode ser compreendida a partir do conjunto das ações individuais reciprocamente referidas. Por isso, Weber define como objeto da sociologia a ação social.
O que é ação social?
Para Weber ação social é qualquer ação que o indivíduo faz orientando-se pela ação de outros. Por exemplo um eleitor. Ele define seu voto orientando-se pela ação dos demais eleitores. Ou seja, temos a ação de um indivíduo, mas essa ação só é compreensível se percebemos que a escolha feita por ele tem como referência o conjunto dos demais eleitores.
Assim, Weber dirá que toda vez que se estabelecer uma relação significativa, isto é, algum tipo de sentido entre várias ações sociais, teremos então relações sociais.
A ação social, é a conduta humana dotada de sentido. O sentido motiva a ação individual.
Para Weber, cada sujeito age levado por um motivo que se orienta pela tradição, por interesses racionais ou pela emotividade.
O objetivo que transparece na ação social permite desvendar o seu sentido, que é social na medida em que cada indivíduo age levando em conta a resposta ou reação de outros indivíduos.
A ação social gera efeitos sobre a realidade em que ocorre.
É o indivíduo que através dos valores sociais e de sua motivação, produz o sentido da ação social.
A transmissão destes valores comuns de uma geração para outra é chamada socialização, que é uma forma inconsciente de coerção social. Ex. de valores sociais: respeito, virgindade, honestidade, solidariedade, etc
Só existe ação social quando o indivíduo tenta estabelecer algum tipo de comunicação, a partir de suas ações, com os demais.
Quando você vai à escola, isto é uma ação social. Não apenas porque ali você encontra seus professores, seus colegas, seu grupo. Estar junto com outras pessoas, apenas, não faz de você um animal social. Ir à escola é uma ação social porque agindo assim você está calculando (mesmo que não pense nisso conscientemente todos os dias) os custos e os benefícios que você terá indo ou, no caso inverso, deixando de ir. Ao ir à escola você emprega sua racionalidade e leva em consideração a racionalidade dos outros e o modo como ela interfere ou pode vir a interferir sobre seu próprio comportamento. Se você fosse puramente racional, poderia dizer: “minha finalidade na vida é ter dinheiro, mulheres (ou homens) à disposição e carros do ano, mas para isso preciso escolher a profissão que me dê mais renda o mais rápido possível; e o meio mais adequado para atingir este fim é ir à escola”.
Mas não precisa ser um cálculo que vise meramente seus interesses pessoais "egoístas", suas finalidades "exclusivamente individuais". Você pode calcular também com base por exemplo no valor que sua família dá à educação. Se em sua casa todos prezarem uma boa educação acima de tudo, será muito difícil pra você deixar de ir à escola, certo? Se um dia você cogitar abandonar os estudos, a primeira coisa que vai pensar será: “o que o pessoal lá em casa vai dizer disso?” Aliás talvez você nem cogite abandonar a escola, porque foi ensinado em casa desde criança que estudar ou que formar-se era algo importante. Levar isso em consideração também é uma forma de cálculo. Mas você pode calcular também com base, por exemplo, na satisfação ou no conforto pessoal que sente em ir à escola, mesmo que essa satisfação não esteja ligada diretamente a suas atividades estudantis. Você pode gostar da escola porque tem amizade com professores e colegas, ou porque arranjou uma namorada ou namorado lá.
Agir em sociedade, portanto, implica em algum grau de racionalidade (inclusive a total irracionalidade) por parte de quem age, e implica no fato de que esta racionalidade de cada indivíduo sempre está referida aos outros indivíduos que os cercam. Isso é fundamental para entender Weber.
Partindo do exemplo acima, quando você vai à escola pensando em se formar e ganhar dinheiro, você está praticando o que Weber chama de ação social racional com relação a fins. Um comportamento racional com relação a fins é aquele que se orienta por meios tidos como adequados (subjetivamente) para obter fins determinados, fins estes tidos por você como indiscutíveis (subjetivamente). Já se você for à escola porque sua formação familiar deu muita importância aos estudos, então você está praticando uma ação social racional com relação a valores. No caso, trata-se dos valores de sua família, ou então do modo como você os incorporou à sua própria hierarquia de valores. Finalmente, se você vai à escola apenas por causa dos amigos, dos professores ou da namorada ou namorado, para Weber você pratica uma ação social afetiva . Neste tipo de comportamento, você estaria sendo irracional, pois o que Weber chama de "racionalidade perfeita" é a adequação entre os meios de que você se vale para agir e os fins que você objetiva alcançar com esta ação. Na ação afetiva, você não leva em consideração objetivos a serem alcançados nem busca utilizar-se dos melhores meios para isso e portanto está sendo irracional. Suponha, finalmente, que você fosse à escola apenas porque todo mundo vai, e ficaria chato pra você, dentro do seu círculo de amizades, dizer que não freqüenta a escola. Nesse caso você volta a ser racional, praticando uma ação social racional com relação ao regular. Você estaria calculando com relação à média de comportamentos aceitos em seu grupo específico.
Tipo Ideal
Repare que Weber gosta de estabelecer tipos de ação. Só no parágrafo acima eu citei quatro tipos diferentes de ação social, sendo três racionais e um irracional. Mas, repare também que no dia-a-dia esses tipos não aparecem separadamente. Ninguém, na prática, vai à escola única e exclusivamente para namorar, nem mesmo só para ganhar o diploma e ganhar dinheiro. Essas coisas todas se confundem, se encaixam umas às outras. É muito possível que você vá à escola por todas ou quase todas essas razões que eu citei no exemplo. As razões se misturam. No entanto, é absolutamente fundamental isolar esses tipos "puros" de comportamento. Aliás, este é o método de Weber. Ele sabe perfeitamente que na prática empírica os tipos puros não existem, mas os constrói para que sirvam de referência.
Ei, alegre-se! Você está sendo apresentado a um dos mais importantes métodos de investigação das ciências sociais. A receita metodológica, passo a passo, é a seguinte:
1. Construa um tipo ideal "puro" (Weber construía vários: tipos de ação social, tipos de dominação política, etc). O tipo é uma construção mental, feita na cabeça do investigador, a partir de vários exemplos históricos. Ele é um exagero de perfeição, que jamais será encontrado na vida prática.
- Olhe o mundo social que o cerca, esta teia inesgotável de eventos e processos, e selecione dele o aspecto a ser investigado (não dá pra ser tudo, tem que ser uma coisa de cada vez).
- Compare o mundo social empírico com o tipo ideal que você construiu. Mas note bem: "ideal" aqui não significa "desejado", não significa "idealizado", como por exemplo idealizar o que seria uma "sociedade perfeita". Significa apenas que você escolhe as características mais "puras" dos tipos, e Weber achava que os tipos de conduta mais puros são os mais racionais, no sentido de adequação entre meios e fins.
- À medida em que você descreve o quanto a realidade se aproxima ou se distancia do tipo "puro" que você construiu essa realidade se apresenta a você, se revela em seu caráter mais complexo; os comportamentos vêm à luz revelando a racionalidade e a irracionalidade que os tornou possíveis.
Daí chegamos a um entendimento melhor do que seja a sociologia que ele chama de compreensiva: trata-se daquela que se refere à análise dos comportamentos movidos pela racionalidade dos sujeitos com relação aos outros.
Dominação e Burocracia
Historicamente, diz Weber, as associações políticas humanas, e o Estado em particular, passaram por um processo de institucionalização. Nesse processo, as regras foram se tornando cada vez mais racionais, isto é, foram sendo feitas com vistas a fins específicos (como a regra segundo a qual os negros não devem ser discriminados apenas pela cor de sua pele) e estabelecendo os meios mais adequados para leva-los a cabo (como as punições que vão de multas em dinheiro a meses de reclusão, que a lei anti-racismo prevê).
Ou seja, esta associação mais abrangente que é o Estado detém um poder de imposição. Tal poder se baseia numa influência específica – que Weber chama de dominação – de homens concretos sobre a "ação em associação" de outros homens. Tal influência, tal dominação, se baseia, por sua vez, entre outras coisas, na possibilidade de aplicação de uma coação (física ou psíquica). Agir segundo esses fins da associação, que são garantidos pela aplicação da coação, é agir segundo um "consenso". As possibilidades de que esse consenso seja de fato posto em prática na vida social serão tanto maiores quanto mais se puder esperar que os indivíduos que obedecem aos regulamentos o façam porque consideram obrigatória, também subjetivamente, a relação de dominação. Quer dizer, quando as pessoas obedecem as regras não apenas porque temem a punição, mas também porque estão convencidas da necessidade de obedecer, porque "introjetaram" a norma, Weber diz que a dominação baseia-se no consenso da legitimidade.
O fundamental aqui, em suma, não é o fato dos homens serem coagidos, mas sim o fato de agirem racionalmente, e de que esta racionalidade os faz consentirem com a dominação à qual estão sujeitos, para que possam com isso ganhar condições de previsibilidade com relação à ação dos outros homens que estão também sujeitos à mesma relação de dominação e, em decorrência, possam viver em sociedade.
O estabelecimento de uma ordem social "com relação a fins" (quer dizer, racional) vai se tornando então cada vez mais amplo. O consenso aí construído é obtido mediante regras e mediante coação, e uma crescente transformação das associações em instituições organizadas de maneira racional com relação a fins se opera na sociedade.
É este o sentido histórico do processo que Weber chama de racionalização.
A história humana, segundo ele, é um processo de crescente racionalização da vida, de abandono das concepções mágicas e tradicionais como justificativas para o comportamento dos homens e para a administração social. Pode-se compreender aqui o sentido de uma outra tipologia muito conhecida de Weber, a das formas de dominação legítima. Para Weber há três tipos puros de dominação legítima: a dominação tradicional, cuja legitimidade se baseia na tradição, a dominação carismática, cuja legitimidade se baseia no carisma do líder, e a dominação racional-legal, cuja legitimidade se baseia na lei e na racionalidade (adequação entre meios e fins) que está por trás da lei. Se a associação estatal passa por um processo de racionalização (e também de burocratização, porque para fazer cumprir as regras racionais é necessária uma burocracia cada vez mais complexa), as formas de dominação no ocidente caminham, tendencialmente, para o tipo racional-legal.
Permita-me recapitular o que foi dito até aqui, para que você entenda melhor a idéia de racionalização e suas implicações para a sociologia da educação weberiana. Diferentemente da concepção organicista de Durkheim e da concepção materialista de Marx, a sociologia histórica de Max Weber parte da ação e da interação dos indivíduos – na base das quais estão também conjuntos de valores compartilhados – como constitutivas da sociedade. Quanto mais complexas as sociedades, isto é, quanto maior sua racionalização, argumenta Weber, maior o número de regulamentos sociais a serem obedecidos. Quanto mais complexa a sociedade, mais conflitiva tende a ser a interação entre os indivíduos e grupos, uma vez que maiores serão as “constelações de interesses” que se contrapõem e maior também a necessidade de regulamentá-los. Ao contrário de Durkheim, em Weber a complexificação gera conflito, o que por sua vez gera a necessidade da regra. A regulamentação mais desenvolvida das lutas em sociedade aparece em Weber como um aparato especializado de domínio, que é o Estado moderno. O ingresso dos indivíduos nesta grande associação, na qual estão obrigados a submeter-se ao poder já instituído, não é voluntário e as regras são feitas, diz ele, por meio da força, da imposição da vontade de alguns indivíduos e grupos sobre outros indivíduos e grupos. Para resumir em duas palavras: uns mandam, outros obedecem e a esse processo Weber chama de dominação. Para legitimar-se, isto é, para garantir a aceitação dos comandados, a dominação se baseia ou na tradição, ou no carisma do líder ou na força do direito racional. No caso da tradição e do carisma, a dominação se exerce pelo domínio dos líderes sobre os dominados, que obedecem por que foram educados (ou seja, compartilharam de uma tradição) ou porque julgam que o líder tenha dotes sobrenaturais (que Weber chama de carisma). Mas no último caso, que é o das sociedades modernas e complexas, a obediência não é devida à figura do líder, mas à posição que ele ocupa no aparato de dominação, devidamente garantida por uma legislação de caráter racional. O exercício da autoridade racional depende de um quadro administrativo hierarquizado e profissional, que se caracteriza pela existência de uma burocracia. É este o sentido histórico do processo que Weber chama de racionalização das sociedades: uma crescente transformação dos modos informais e tradicionais de extração de obediência em instituições organizadas racionalmente, impessoalmente e legalmente para a obtenção desta obediência.
A educação para Weber, ao que me parece, é o modo pelo qual os homens – ou determinados tipos de homens em especial – são preparados para exercer as funções que a transformação causada pela racionalização da vida lhes colocou à disposição.
A lógica da racionalidade, da obediência à lei e do treinamento das pessoas para administrar as tarefas burocráticas do Estado foi aos poucos se disseminando. Na formação do Estado moderno e do capitalismo moderno, que são inseparáveis um do outro, Weber dá especial atenção a dois aspectos: de um lado, a constituição de um direito racional, um dos pilares do processo de racionalização da vida, e de outro, a constituição de uma administração racional em moldes burocráticos. O direito racional oferece as garantias contratuais e a codificação básica das relações de troca econômica e troca política que sustentam o capitalismo e o Estado modernos, enquanto que o desenvolvimento da empresa capitalista moderna oferece o modelo para a constituição da empresa de dominação política própria do capitalismo, o Estado burocrático.
E aqui é que se torna mais claro o modo como Weber pensa a educação. A educação sistemática, analisa ele, passou a ser um "pacote" de conteúdos e de disposições voltadas para o treinamento de indivíduos que tivessem de fato condições de operar essas novas funções, de "pilotar" o Estado, as empresas e a própria política, de um modo "racional". Um dos elementos essenciais na constituição do Estado moderno é a formação de uma administração burocrática em moldes racionais. Tal processo só ocorreu de modo completo no Ocidente, onde houve a substituição paulatina de um funcionalismo não especializado e regido por orientações mais ou menos discricionárias (não baseadas em regras), por um funcionalismo especificamente treinado e politicamente orientado com base em regulamentos racionais.
Para Weber a burocracia é a mais bem acabada forma de dominação legítima e racional. A burocracia baseia-se na crença na legalidade ou racionalidade de uma ordem. A burocracia mais eficaz de exercer a dominação. E é uma conseqüência do processo de racionalização da vida social moderna, sendo responsável pelo gerenciamento concentrado dos meios de administração da sociedade. A burocracia é uma forma de organizar o trabalho, é um padrão de regras para organizar o trabalho em sociedades complexas. A modernização para ele é o processo de passagem de uma perspectiva mais tradicional do mundo (em que as coisas são dadas) para uma perspectiva mais organizada (onde as coisas são elaboradas, construídas).
REFERÊNCIAS
ARON, Raymond. As etapas do pensamento sociológico. 4ª ed. - São Paulo: Martins Fontes, 1993.
COSTA, Cristina. Sociologia: introdução à ciência da sociedade. 2ª ed. - São Paulo: Moderna, 1997.
TOSI, Alberto. Sociologia da Educação. Rio de Janeiro: DP&A Editora, 2000. - Coleção “O que você precisa saber sobre...”
gostei muito da interpretação do texto. clareou bastante minhas ideias
ResponderExcluirParabéns pelo texto.
ResponderExcluirFica o convide para visitar meu blog
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